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Saiba tudo sobre o teto do Fies

ProFies

Atualizado: há 16 horas

O Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), programa do Ministério da Educação (MEC), oferece crédito para cobrir mensalidades em instituições privadas de ensino superior.


Entretanto, o MEC estabelece um teto de financiamento – um valor máximo semestral que pode ser financiado por aluno. Qualquer quantia da mensalidade que exceda esse teto não é coberta pelo Fies, ficando sob responsabilidade do estudante (coparticipação). Por exemplo, a partir do 2º semestre de 2023 o teto semestral do Fies foi fixado em R$ 60 mil para cursos de Medicina (equivalente a R$ 10 mil mensais), enquanto para os demais cursos permanece em R$ 42.983,70 por semestre. Esses limites ilustram a política de contenção de gastos do programa, cuja justificativa baseia-se em critérios econômicos e políticos que discutiremos a seguir.


Motivos e critérios para o teto do Fies (razões econômicas e políticas)


O MEC define um teto de financiamento do Fies considerando critérios de sustentabilidade financeira e políticas públicas. Do ponto de vista econômico, o limite existe para manter o programa viável no orçamento governamental e evitar custos excessivos. Entre 2010 e 2015, o Fies passou por uma expansão explosiva – de cerca de 200 mil estudantes financiados para 1,9 milhão – fazendo o custo anual saltar de ~R$ 1 bilhão para R$ 20 bilhões.


Uma auditoria do TCU em 2016 apontou que esse crescimento tornara o modelo insustentável sem mudanças. O governo subsidiava juros abaixo da inflação e enfrentava inadimplência muito acima do previsto (taxas de até 40%, quando se projetavam 10%).


Diante disso, o MEC implementou “medidas saneadoras” para controlar gastos e riscos, entre elas a limitação do valor financiado por estudante. O então ministro Mendonça Filho destacou em 2017 que reduzir o teto era necessário para “assegurar a sustentabilidade do programa”, permitindo atender mais alunos dentro do orçamento disponível. Em outras palavras, baixar o teto libera recursos para financiar um número maior de estudantes em vez de concentrar verbas em poucas mensalidades muito altas.


Outro critério econômico é evitar a cobertura de preços considerados abusivos ou irreais. O MEC sinalizou que não seria razoável o governo arcar integralmente com mensalidades exorbitantes. Decidiu-se pressionar para uma moderação nos valores cobrados: ao impor um teto, o governo (tenta) desestimula aumentos desproporcionais de mensalidade, já que qualquer valor além do limite não será coberto pelo Fies. Houve inclusive a implementação de regras de compliance de preços no Novo Fies – por exemplo, exigindo que a instituição ofereça ao aluno financiado a menor mensalidade praticada naquela turma. Essa medida política previne que faculdades elevem preços apenas para estudantes com Fies, garantindo maior equidade no uso dos recursos públicos.


Do ponto de vista político e social, a definição do teto também reflete escolhas de prioridade governamental. Nos anos de expansão, o Fies foi usado como instrumento de democratização do ensino superior; já em anos de ajuste fiscal, o governo optou por limitar investimentos.


Em 2015, em meio à crise econômica e cortes orçamentários, o governo restringiu o programa – focando em cursos prioritários (saúde, engenharias, licenciaturas) e estabelecendo travas de financiamento – para conter a escalada de gastos públicos.


Posteriormente, com a reformulação do Fies em 2018 (Novo Fies), adotaram-se mecanismos de divisão de riscos com bancos e faculdades, reduzindo a responsabilidade exclusiva da União sobre inadimplência. Com esse cenário mais seguro, o MEC teve margem política para ampliar novamente o teto e incluir cursos caros sem comprometer a saúde financeira do programa. Decisões recentes, como o aumento do teto para Medicina em 2023, também derivam de pressões sociais e setoriais: houve reivindicação de estudantes e reconhecimento do MEC de que, sem ajuste, muitos alunos de baixa renda não conseguiriam se manter em Medicina. Em suma, os critérios para o teto combinam análise econômica (custos, inadimplência, orçamento) e consideração política (prioridades educacionais, justiça social e diálogo com demandas dos beneficiários).


Mudanças recentes nos valores máximos financiados (teto Fies)


A política do teto do Fies passou por ajustes significativos na última década, oscilando conforme o contexto econômico e decisões governamentais. As principais mudanças recentes incluem:


2015 – Diante do forte aumento dos gastos, o governo federal introduziu restrições no Fies. Passou-se a exigir desempenho mínimo no Enem e reduziu-se a abrangência do financiamento. Embora um teto formal não estivesse claramente divulgado no início de 2015, na prática o MEC começou a restringir contratos em cursos de mensalidade muito alta (especialmente Medicina), visando segurar custos. Ainda em 2015 e 2016, utilizou-se aproximadamente R$ 7 mil mensais (R$ 42 mil/semestre) como valor máximo financiado – patamar que cobria a maioria dos cursos, incluídas grande parte das faculdades de Medicina da época.


2017 – Em fevereiro, o MEC reduziu o teto de R$ 42 mil para R$ 30 mil por semestre para novos financiamentos (de ~R$ 7 mil para R$ 5 mil mensais). Essa mudança, implementada pelo Comitê Gestor do Fies, entrou em vigor no primeiro semestre de 2017 e foi justificada pela necessidade de tornar o programa mais sustentável. Autoridades pontuaram que, se corrigido pela inflação, o antigo teto já chegaria a R$ 46 mil/semestre – valor considerado insustentável no cenário fiscal do país. Portanto, optou-se por diminuir o limite, mesmo cientes de que isso afetaria principalmente cursos caros. A consequência imediata foi que, a partir de 2017, apenas cursos com mensalidade até ~R$ 5 mil poderiam ser financiados integralmente; cursos acima desse valor exigiriam pagamento de diferença pelo estudante.


2018 – Após a reformulação do programa (lançamento do Novo Fies), o MEC voltou atrás parcialmente na restrição anterior. Em junho de 2018, foi anunciado o reajuste do teto semestral para R$ 42 mil (cerca de R$ 7 mil mensais) a partir do 2º semestre daquele ano. Na prática, isso restabeleceu o limite que vigorava antes de 2017, ampliando em 43% o valor financiável em relação ao teto de R$ 30 mil. O ministro Rossieli Soares explicou que o limite de R$ 5 mil mensais havia excluído muitos candidatos de Medicina, dado que as mensalidades desse curso superavam esse montante. Com as novas garantias do Novo Fies (como participação das instituições no risco e obrigação de menor preço da turma para estudantes com Fies), o governo sentiu-se seguro para elevar o teto sem repetir os problemas do passado. Assim, desde 2018 a maioria dos cursos voltou a ter até ~R$ 42 mil por semestre financiados.


2021 – 2022 – Mesmo após 2018, o teto de ~R$ 42 mil ficou defasado diante da inflação educacional, especialmente em Medicina. Em julho de 2022, o MEC reajustou o limite mensal de R$ 7,2 mil para R$ 8,8 mil (via Resolução do CG-Fies), o que corresponde a um teto semestral aproximado de R$ 52,8 mil. Esse ajuste beneficiou principalmente estudantes de cursos de saúde com altas mensalidades, e passou a valer para renovações e novos contratos posteriores à resolução. No entanto, houve casos em que contratos antigos não aplicaram o novo teto automaticamente, levando estudantes a acionarem a justiça para garantir o direito ao reajuste do financiamento conforme a norma.


2023 – Atento às reivindicações estudantis e ao contínuo aumento das mensalidades, o MEC promoveu novo aumento no teto do Fies para Medicina. A partir do 2º semestre de 2023, o limite semestral para cursos de Medicina subiu de R$ 52.805,66 para R$ 60 mil, equivalendo a R$ 10 mil por mês. Esse reajuste de 13,6% foi oficializado pela Resolução nº 54/2023 do Comitê Gestor do Fies. Os demais cursos permaneceram com teto de R$ 42.983,70 no semestre. A mudança visa(va) alinhar o financiamento ao patamar das mensalidades praticadas, já que muitos cursos de Medicina em particulares ultrapassavam R$ 10 mil mensais. Conforme o FNDE, a pauta do aumento do teto em Medicina era prioritária para evitar evasão de alunos por incapacidade de pagar a diferença, e essa correção deve amenizar os custos mensais dos estudantes de baixa renda e ajudá-los a se manter no curso. Não amenizou nada e o teto precisa ser revisto.


Impactos da limitação do teto do Fies


Para os estudantes


A existência de um teto de financiamento afeta diretamente a capacidade dos estudantes arcarem com cursos de alto custo. Quando as mensalidades ultrapassam o valor máximo financiado, os alunos precisam pagar a diferença mensal (coparticipação). Esse cenário tem impactos negativos sobre estudantes de baixa renda, pois muitos não conseguem complementar do próprio bolso valores significativos. Por exemplo, antes do reajuste de 2023, o teto mensal de ~R$ 8,8 mil no Fies fazia com que estudantes de Medicina tivessem que cobrir mais de R$ 1.000 por mês para cursos com mensalidades em torno de R$ 10 mil. Diversos alunos relataram dificuldade em manter esses pagamentos e cogitaram abandonar a faculdade por não conseguir arcar com a diferença entre o teto e o valor real da mensalidade. Cada reajuste insuficiente das mensalidades pelas faculdades agravava a situação, aumentando paulatinamente o valor descoberto a ser pago pelos alunos. Nesse contexto, o aumento do teto (como o de 2023) atua para reduzir a carga financeira do estudante, tornando a permanência no curso mais viável.


Por outro lado, a limitação do financiamento força os candidatos a considerar o custo antes de ingressar. Se o curso desejado tiver mensalidade muito acima do teto, o aluno precisará avaliar se terá condições de assumir a parcela não financiada. Isso pode influenciar escolhas de carreira ou instituição, levando alguns a optarem por cursos mais baratos ou por universidades públicas caso a diferença seja proibitiva. Em 2017, quando o teto caiu para R$ 5 mil mensais, muitos estudantes de Medicina simplesmente não puderam obter Fies (pois suas mensalidades excediam esse valor). Essa exclusão contradiz a proposta de inclusão do programa, afetando especialmente carreiras de maior custo. Já em 2018, com a revisão do limite para R$ 7 mil mensais, houve alívio: estudantes antes excluídos (como candidatos de Medicina) voltaram a ter acesso ao financiamento . Ou seja, um teto mais alto amplia as oportunidades educacionais para alunos de baixa renda em cursos caros, enquanto um teto mais baixo pode limitar o acesso desses grupos justamente em áreas estratégicas (como saúde e engenharia).


Adicionalmente, a porção do financiamento não coberta pelo Fies representa um esforço financeiro extra no futuro. Embora o Fies tradicional (modalidade 1) ofereça juros zero aos mais pobres atualmente, quaisquer valores pagos durante o curso (coparticipação) não estão subsidiados – saem do orçamento familiar imediato. Já os valores financiados serão pagos apenas após a formatura, com condições facilitadas. Assim, se o teto é baixo e o aluno paga muito durante a graduação, ele carrega um peso financeiro no presente; se o teto é alto e cobre praticamente tudo, o peso é postergado para a fase de amortização. Nesse sentido, encontrar um equilíbrio é crucial: o objetivo é que os egressos consigam pagar a dívida depois de formados, sem terem desistido antes por falta de recursos. A política recente de divulgar aos candidatos a média salarial de profissionais formados em cada região/curso visa justamente conscientizar o estudante sobre a relação entre dívida e renda futura. Em resumo, para os estudantes, um teto de financiamento bem calibrado é a diferença entre viabilizar o sonho do ensino superior ou vê-lo frustrado por limitações financeiras imediatas.


Para as instituições privadas de ensino


As faculdades e universidades particulares também são profundamente impactadas pelo teto do Fies. Nos anos de expansão do programa, muitas instituições passaram a depender do Fies como fonte de receita garantida. Com o governo pagando as mensalidades financiadas, as instituições reduzem riscos de inadimplência e aumentam a ocupação de vagas. Um juiz federal observou que o Fies beneficia diretamente as faculdades, pois assegura uma fonte de pagamento mais confiável do que a cobrança tradicional aos alunos, além de permitir a ampliação do número de vagas preenchidas . Não surpreende, portanto, que o setor privado tenha interesse em tetos elevados e em ampla oferta de financiamentos. Quando o teto está alto o suficiente para cobrir praticamente toda a mensalidade de cursos caros, as instituições conseguem atrair mais estudantes de baixa renda para essas vagas, garantindo receita integral (via Fies) ou quase integral.


Por outro lado, se o governo impõe um teto mais baixo, as instituições de ensino podem enfrentar redução na demanda por determinados cursos. Isso ocorreu em 2015-2017, quando o Fies restringido resultou em sobras de vagas em faculdades privadas, já que muitos candidatos não conseguiam assumir as mensalidades parcialmente descobertas. A Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior (ABMES) chegou a criticar a redução do teto em 2017, argumentando que o fim do financiamento de 100% das mensalidades se tornaria “mais um dificultador” para cursos como Medicina, causando potencial ociosidade de vagas porque “o aluno tem que arcar com a diferença” . Ou seja, um teto baixo pode forçar instituições a abaixar preços ou oferecer descontos/próprias bolsas para viabilizar a matrícula de alunos Fies, caso contrário correm o risco de salas vazias. Cursos de alto valor (Medicina, Odontologia, etc.) em faculdades menores ou recém-criadas foram os mais afetados durante as restrições – alguns tiveram que readequar seu modelo financeiro ou desistir de expandir turmas sem o apoio robusto do Fies.


Além disso, a política de teto influencia o comportamento de precificação das instituições. No auge do Fies (até 2014), havia críticas de que algumas faculdades inflacionaram suas mensalidades aproveitando a facilidade de crédito estudantil subsidiado. Relatos indicam que muitas chegaram a incentivar alunos já matriculados a aderir ao Fies em vez de pagar do próprio bolso, transferindo o risco de inadimplência para o governo  . A imposição de um teto e de outras regras (como a mencionada obrigatoriedade do menor preço da turma para beneficiários) atuou como freio a esses abusos. Com o teto, se a instituição elevar demais a mensalidade acima do limite financiado, essa parcela extra pode se tornar impagável para o aluno-alvo, inviabilizando matrículas. Portanto, o teto força as instituições a manterem os preços dentro de um patamar “financiável” se quiserem captar alunos via Fies. Em contrapartida, quando o teto é ajustado para cima (como em 2018 e 2023), as instituições ganham margem para aplicar reajustes nas mensalidades de cursos caros sem perder completamente a clientela de estudantes financiados – embora devam considerar a capacidade de pagamento futura desses alunos após a formatura, já que o Novo Fies envolve compartilhamento do risco de inadimplência através de fundos garantidores.


Em síntese, para as IES privadas, o teto do Fies atua como um balizador de mercado: um valor muito baixo limita a expansão de matrículas financiadas e pode exigir adaptações nos preços ou nos custos dos cursos; já um valor mais alto amplia o universo de estudantes financiáveis, fortalecendo a receita garantida pelo programa. As instituições, cientes disso, participam ativamente do debate – seja reivindicando tetos maiores quando veem queda na procura, seja aceitando maiores contrapartidas (como risco compartilhado e transparência nos preços) para assegurar a continuidade do programa de financiamento estudantil.


Considerações finais


A política de definição do teto do financiamento do Fies mostra o desafio de equilibrar inclusão educacional e responsabilidade fiscal. O governo federal, por meio do MEC e do Comitê Gestor do Fies, ajusta periodicamente esse limite conforme a conjuntura econômica e as prioridades sociais. Em momentos de crise e alta inadimplência, prevalece a contenção: restringe-se o valor financiado visando manter o programa solvente e amplo o suficiente para atender quem mais precisa. Em momentos de estabilidade ou diante de demandas por maior acesso, o teto pode ser expandido para cobrir melhor os cursos onerosos, garantindo que alunos talentosos de baixa renda não fiquem de fora por questões financeiras  . Nos anos recentes, vimos exemplos claros dessas duas dinâmicas e seus impactos associados.


Do ponto de vista dos estudantes, especialmente os de menor renda, um teto de financiamento adequado significa a possibilidade real de cursar o ensino superior privado sem se endividar além do que poderão pagar no futuro ou sem abandonar os estudos por falta de dinheiro no presente. Do ponto de vista das instituições privadas, o teto representa tanto um limite às mensalidades efetivamente cobertas pelo governo quanto uma garantia de receita até certo ponto – desde que mantenham seus preços dentro do alcance dos financiamentos. As decisões sobre o teto têm implicações diretas na quantidade de vagas preenchidas via Fies, na saúde financeira do programa e até na distribuição de profissionais formados em áreas estratégicas do país (como Medicina, cuja formação o governo tem interesse em fomentar sem, contudo, onerar demasiadamente os cofres públicos).


O debate econômico-político em torno do teto do Fies provavelmente continuará. Autoridades educacionais já indicam que estão conduzindo estudos técnicos para embasar novas melhorias no programa , buscando aprimorar a política de financiamento estudantil de forma sustentável e inclusiva. Assim, o teto do Fies deve ser visto não como um valor estático, mas como uma ferramenta de gestão que o MEC ajusta para alinhar o Fies com a realidade econômica do país e com os objetivos de política educacional – garantindo, na medida do possível, que o investimento público em educação superior privada traga retorno social sem comprometer o equilíbrio financeiro do programa.

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